A importância da elaboração de quesitos para o sucesso no processo

A elaboração de quesitos é de extrema relevância para a eficácia de uma perícia independentemente da natureza do processo (civil, criminal, trabalhista, entre outros) ou do estágio em que este se encontre (quesitos iniciais, suplementares ou de esclarecimentos).

Mas inicialmente o que é o quesito? O quesito nada mais é que uma pergunta, elaborada por operadores do direito (juízes de direito, ministério publico, defensoria pública ou advogados das partes) e/ou assistentes técnicos, no intuito de trazer à luz esclarecimentos com aquele exame pericial.

Mas a elaboração de quesitos é obrigatória? Não, porém como pretendemos evidenciar neste artigo ela é muito importante. Primeiro porque o Perito não pode se furtar em responder os quesitos. Todos os quesitos devem estar explicitamente respondidos no laudo pericial. Logo, se você quer a garantia que algo será examinado pelo Perito, você deve elaborar os quesitos!

E se a parte não possuir um assistente técnico, pode apresentar os quesitos? Sim, claro! Neste caso o advogado da parte é quem deve elaborar/apresentar os quesitos de interesse. Todavia, como visualizaremos ao longo deste artigo a participação de um profissional assistente pode complementar tecnicamente, produzindo sinergia, uma vez que não em raras ocasiões poderá faltar expertise do ponto de vista técnico ao operador do direito. Logo, investir em um assistente técnico neste processo pode agregar significativamente para a estratégia da parte.

Baseado na minha experiência profissional, abordarei cinco fatores que considero críticos para a elaboração de quesitos e que fazem efetivamente a diferença.

1) Estratégia

Os quesitos anexados ao processo são apenas a ponta do iceberg. Por trás destes está um estudo minucioso de todo o processo, cenário e legislações/normativas correlatas. A partir daí devem ser elencados quais os pontos de interesse que você gostaria que fossem analisados pelo Perito. Elaborar quesitos de última hora ou sem analisar previamente todo o processo, apenas para “apresentar algo” é, ao meu ver, negligenciar consideravelmente os riscos. Conhecido o processo e definido os pontos de seu interesse, você deve ter sido capaz de identificar os pontos fortes e fracos ao teu pleito, ou seja, os riscos envolvidos (que muito possivelmente serão explorados pela outra parte) bem como as oportunidades (a serem exploradas por você). A elaboração de quesitos deve seguir uma estratégia do macro ao micro de modo a garantir que o Perito examine aquele ponto de interesse, e se possível, sob a sua ótica.

2) Objetividade e coerência

Os quesitos devem ser apresentados de forma organizada e inteligível. Frequentemente sou indagado: “Mas como eu posso perguntar isso … ?” E em boa parte das ocasiões a resposta que dou é: “Desta forma mesmo!”. Perguntas objetivas, coesas e claras tendem a ser mais eficazes. Quesitos demasiadamente extensos, prolixos, podem restar confusos, ambíguos e nestas circunstâncias a resposta obtida pode sequer ter respondido o que você desejava inicialmente. Se houverem várias perguntas a serem realizadas, convêm realiza-las individualmente. Lembre-se ainda que o quesito serve para trazer à luz questionamentos para hipóteses examinadas naquele exame pericial. Arguição, convencimento, jurisprudências devem ser exploradas nas peças adequadas. Eruditismos desnecessários também podem restar confusos e interpretações equivocadas quase sempre resultarão em respostas indesejadas. Evite elaborar quesitos redundantes (perguntando a mesma coisa com outras palavras) apenas para compor quantidade, isso dificilmente agregará resultado efetivo a sua estratégia.

Quesitos rasos como: “O senhor Perito conhece a Lei nº 8.112/1990?” agregam muito pouco para a sua estratégia, e, por incrível que pareça são comuns na casuística forense, exatamente pela falsa impressão de alguns operadores do direito que a quantidade impactará positivamente. Primeiro, que conhecer algo é demasiadamente subjetivo (e aqui já adentramos no próximo fator de sucesso: assertividade). Ler uma vez a dez anos atrás ou mesmo ouvir falar em alguma ocasião anterior já poderiam ser suficientes para o expert julgar “conhecer”, ou seja, a resposta ficará totalmente sujeita a interpretação e avaliação (subjetiva) do Perito. Por fim, abordar os conceitos teóricos de forma ampla e/ou genérica dificilmente agregará resultados significativos. Priorize de forma objetiva e precisa os itens de interesse contidos nas normativas/legislações que sejam correlacionadas ao objeto da lide.

3) Assertividade

Possuir uma visão sistêmica da perícia em relação ao conjunto em que esta se encontra inserida é fundamental. A perícia é intrinsecamente técnica e objetiva. Logo, esta é por bem independente, imparcial e isenta de julgamentos de valores. Compreender e elaborar os quesitos aderentes a esta mecânica proporcionará, sem dúvidas, melhores resultados. O Perito levanta dados, hipóteses a partir dos quais faz inferências que podem resultar em conclusões, tal qual na metodologia cientifica. Logo, os quesitos devem explorar estes aspectos. Evite utilizar julgamentos de valores ou aspectos subjetivos em seus quesitos. Por exemplo, ao invés de se perguntar se em algum evento “melhorou” ou “piorou” determinada condição, torna-se mais adequado arguir acerca da alteração de parâmetros e compara-los, se possível, com os contidos em normas ou referências conhecidas. O emprego de termos e expressões adequadas do ponto de vista técnico também apresenta impacto relevante, uma vez que perguntas conceitualmente incorretas podem gerar respostas indesejadas e impactar negativamente sua estratégia inicial. Claro, que nesta hipótese o Perito pode ter a perspicácia de ainda assim identificar o real questionamento e atende-lo, porém certamente não é a estratégia mais segura. Neste aspecto, resta claro que quanto mais o elaborador de quesitos dominar a área dos exames, maior serão as chances de sucesso para a sua estratégia.

4) Personalização

Por mais que existam processos efetivamente semelhantes, a reflexão “cada caso é um caso” é totalmente verdadeira. Não existe receita de bolo e tampouco um manual de quesitos que irá lhe resolver tudo automaticamente. Lembre-se que o primeiro fator crítico de sucesso é a estratégia e para isso é necessário um estudo minucioso do processo. Existem sim, manuais, cadernos de quesitos, sobretudo em órgãos correlacionados aos órgãos de perícia oficial contendo quesitos padrões para diversas naturezas de exames (Google it! e você vai achar alguns facilmente). No entanto, estas iniciativas têm o objetivo principal de padronizar os quesitos para as autoridades requisitantes bem como assegurar um conteúdo mínimo padrão para os laudos oficiais. Mesmo que possam ser utilizados quesitos genéricos, a elaboração de quesitos específicos ao caso concreto não deve ser negligenciada. Lembre-se que o Perito não pode se furtar de responder ao quesito. Neste caso, a personalização de quesitos orientados especificamente para os pontos de interesse do caso concreto, direcionará os exames para aquela direção e perspectiva, aumentando significativamente as chances de sucesso da sua estratégia, uma vez que aqueles pontos não serão esquecidos durante as análises dos exames.

5) Lições aprendidas

A experiência neste caso também agrega valor. Ao término de cada processo analise o resultado obtido, quais foram os quesitos elaborados e as respostas obtidas. Certamente haverão lições aprendidas e esta revisão cíclica certamente proporcionará não apenas mais agilidade na construção dos quesitos como também na adoção de melhores estratégias.

Para ilustrar vou tentar definir um exemplo prático. Imagine que você seja o advogado ou assistente técnico em uma causa trabalhista de uma parte que enseja receber o adicional de periculosidade por se expor a eletricidade. O juiz nomeou um Perito do juízo. Neste caso elaborar quesito apenas finalístico e genérico como, por exemplo: “As atividades desempenhadas pelo trabalhador dão ensejo ao recebimento do adicional de periculosidade?” pode ser altamente arriscado, uma vez que o exame do Perito do juízo pode restar míope sob a sua perspectiva, isto é, que ele não examine adequadamente o objeto de interesse do seu cliente. Mas qual seria a estratégia mais adequada então? Após analisado o caso concreto, você deve ter sido capaz de identificar qual a razão que o seu cliente enseja o recebimento da periculosidade, seja por trabalhar diretamente em alta tensão, desenvolver suas atividades em proximidades, entre outras possibilidades,  conforme o Anexo IV da NR 16 – NORMA REGULAMENTADORA 16 – ATIVIDADES E OPERAÇÕES PERIGOSAS . Considere que no caso hipotético em tela seja o trabalhador desenvolver as atividades também em zona de risco. Considere que ele não seja um colaborador da elétrica propriamente, mas que desenvolva alguma atividade que também adentre na zona de risco segundo a NR 10 NORMA REGULAMENTADORA 10 – SEGURANÇA EM INSTALAÇÕES E SERVIÇOS EM ELETRICIDADE.

Bom, imagine que apesar da intenção do juízo em nomear um perito altamente  qualificado, este Perito poderia ser especializado em engenharia de segurança do trabalho por exemplo, mas não possuir amplo expertise propriamente para os trabalhos relacionados a eletricidade.

Logo uma estratégia mais adequada do que o quesito finalístico genérico, seria:

  • Elaborar quesitos teóricos pertinentes para garantir que o Perito conheça ou mesmo estude o aspecto da normativa, legislação correlata que impacta diretamente o seu ponto de interesse. Por exemplo: “Segundo a NR-10, o que é zona de risco e zona controlada?” Isso, tende a assegurar que o Perito pesquise e saiba que quando você se referir a zona de risco, será em relação ao conceito definido na NR-10 e não a uma zona subjetiva de risco por exemplo.
  • Elaborar quesitos que evidenciem o desenvolvimento das atividades e acesso do colaborador aquela zona de risco (explorar ordens de serviço, controles de acesso, PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário), entre outras inúmeras possibilidades, a depender de cada caso. Observe ainda que nesta série de quesitos também pode ser importante você assegurar que o Perito examine e veja que essas atividades não tenham o caráter eventual – o que poderia prejudicar o seu pleito.
  • Elaborar quesitos que porventura minimizem o impacto dos pontos fracos que foram definidos lá no inicio da estratégia. Por exemplo, imagine que o PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário) do caso em tela não corroborasse a favor do colaborador, uma vez que a natureza das atividades ali expostas não evidenciam a necessidade de adicional de periculosidade. Porém o PPP poderia estar desatualizado. Logo um quesito acerca da data da última revisão consignaria no laudo esta informação, o que poderia ser explorado na sequencia pela parte, no intuito de desqualificar perante o juízo a confiabilidade daquelas informações ali contidas.
  • Elaborar os quesitos finalísticos, também! Não em raras ocasiões o laudo pode consignar diversos levantamentos, análises e não apresentar uma conclusão propriamente dita. O que pode inclusive ficar confuso e dar margem a dúvida quanto ao resultado do laudo. Logo, o quesito finalístico forçará o Perito a concluir o raciocínio ainda que este não tenha feito previamente.

Luiz Laborda é graduado em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal de Goiás – UFG (2007), possui MBA em Gerenciamento de Projetos pela Fundação Getúlio Vargas – FGV (2010) e mestrado em Engenharia Elétrica – Área de concentração: Informática Forense e Segurança da Informação pela Universidade de Brasília – UNB (2016). É Perito Oficial Criminal do Estado de Mato Grosso desde 2011 e integrante do corpo técnico da Laborda Ventura e Peritos associados.

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